Geração de Energia

Revisão de 11h21min de 24 de junho de 2022 por LauraCriadoMotheo (discussão | contribs)

Recursos energéticos são quaisquer recursos naturais que possam ser aproveitados para obter energia. A Amazônia Azul oferece uma grande quantidade de recursos energéticos para o Brasil. O petróleo e o gás natural, por exemplo, representam cerca de 45% da matriz energética brasileira, sendo que 95% do petróleo e 80% do gás natural produzidos no Brasil vem da Amazônia Azul[1] (vide: Atividade Petrolífera).

Além do petróleo e do gás natural, existem outros recursos energéticos alternativos associados ao mar, e oferecidos pela Amazônia Azul, que estão atraindo grande atenção e sendo amplamente considerados, principalmente com a finalidade de diminuir a dependência mundial dos combustíveis fósseis, esgotáveis, e aumentar a matriz energética limpa e renovável. Assim, o aproveitamento dos recursos do mar apresenta perspectivas promissoras em função de vários fatores tais como extensas áreas, ampla distribuição mundial dos oceanos e, principalmente, altas densidades energéticas, as maiores entre todas as fontes renováveis.

Em princípio, é possível gerar energia elétrica a partir dos processos marinhos dinâmicos, como ondas, correntes e marés, e termodinâmicos, como gradientes verticais de temperatura e horizontais de salinidade, além dos processos eólicos que ocorrem sobre a Amazônia Azul.

Abaixo, foram compiladas informações de artigos do Instituto Oceanográfico da USP (IO-USP)[2], do Centro de Excelência para o Mar Brasileiro (CEMBRA)[3] e do livro “O Valor do Mar”[4] sobre essas fontes de energia.

Energia das marés

As marés são movimentos oscilatórios do nível do mar, que ocorrem devido à atração gravitacional da Lua e do Sol e ao efeito da rotação da Terra. A força geradora da maré consiste primordialmente na resultante gravitacional do sistema Sol-Terra-Lua, a qual depende diretamente das massas dos corpos celestes e inversamente do cubo da distância entre eles. Outros fatores influenciam as marés, como a forma do litoral, o fundo do mar e os fenômenos meteorológicos[3].

Como resultado do movimento periódico dos astros, as marés apresentam recorrência entre 12 e 24 horas, em função da localização no globo terrestre, e sua amplitude varia com o tempo, e depende da periodicidade e da intensidade dos fenômenos astronômicos envolvidos, além, principalmente, da posição e das características da costa. Em estuários estreitos há uma tendência de maior concentração de energia por unidade de largura e ressonância na reflexão da onda de maré, ocasionando o aumento de sua amplitude[3]. Quanto maior a alteração do nível do mar, ou seja, a amplitude da maré, maior é o potencial energético.

Existem duas tecnologias sendo desenvolvidas no mundo para aproveitar a energia das marés. Uma utiliza barragens e outra geradores no fundo do mar - as turbinas submarinas, que se aproveitam do movimento das correntes para gerar eletricidade.

Nas barragens, o desnível entre as águas represadas em regiões litorâneas e aquelas situadas imediatamente ao largo da barragem é aproveitado para transformar essa diferença de energia potencial em energia elétrica, de forma muito semelhante àquela existente nas usinas hidroelétricas continentais. A primeira usina de barragem de maré foi construída no estuário do Rio Rance, no norte da França, em 1966, com capacidade para gerar até 40 MW, energia suficiente para iluminar 130 mil casas. Entretanto, a construção de barragens em regiões costeiras e estuarinas tem custo ambiental elevado por causa da deterioração dos habitats marinhos. Assim, outra forma de utilização da energia das marés seria através de turbinas subaquáticas, que aproveitam a energia cinética das correntes de maré gerando até 1.500 kW com uma única turbina, usando a tecnologia atual; dependendo da corrente local, são como verdadeiros "moinhos de vento submersos”[2].

Ambientes costeiros com grande amplitude de marés na costa brasileira ficam restritos à região Norte, como o Golfão Maranhense e a costa nordeste do estado do Amazonas, ao norte da foz do Rio Amazonas, em razão do fenômeno de ressonância entre a onda de maré do oceano profundo e os modos naturais de oscilação da plataforma continental. Nessas duas regiões as correntes de maré também são intensas, principalmente no Golfão Maranhense, onde chegam a atingir valores superiores a 2 m/s[2].

Energia das ondas

As ondas do mar são consequência da transferência de energia dos ventos, ao longo de uma faixa sobre a superfície oceânica. Os ventos, por sua vez, são causados pelos gradientes de pressão existentes na superfície terrestre, ocasionados pelo aquecimento solar desigual do planeta.

A energia contida nas ondas é, portanto, uma forma de energia solar, porém mais concentrada. O fator de acumulação de energia solar na formação dos ventos é de dois a seis vezes, enquanto o fator de acumulação da energia eólica em energia de onda é de aproximadamente cinco vezes. Isto significa que, para um mesmo potencial energético, são necessárias menores áreas para conversão da energia das ondas em eletricidade do que aquelas para os aproveitamentos das energias solar e eólica[3].

O potencial de geração de energia pelas ondas de alta frequência em todos os oceanos é estimado em aproximadamente 2 mil GW. Estudos feitos na costa oeste americana estimam que, em média, tais ondas produzam entre 40 e 70 W/m. Projetos de extração de energia diretamente da oscilação vertical da superfície do mar durante a passagem das ondas, ou das variações de pressão em subsuperfície decorrentes desse mesmo movimento ondulatório, vem sendo investigados em vários países, inclusive no Brasil (CASTRO et al., 2017)[2].

O primeiro projeto-piloto de usina de ondas no Brasil, e também nas Américas, foi instalado no porto do Pecém, no Ceará, em 2006, com previsão inicial para operar por três anos, mas manteve-se na ativa por quatro anos. Tratou-se de uma usina estilo onshore, ou seja, apoiada no continente e com estrutura instalada sobre o quebra-mar. A tecnologia empregada, concebida e patenteada pelo Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), foi a primeira no mundo a usar uma câmara hiperbárica, isto é, que utiliza um sistema de altíssima pressão para movimentar a turbina e o gerador[4]. O protótipo foi resultado de uma parceria entre Coppe, Eletrobrás e governo do estado do Ceará.

No Brasil, o potencial de geração de energia das ondas e das marés é bastante substancial, segundo a análise da Coppe. Pode chegar a 114 GW apenas na zona costeira, sem contar o alto-mar, e que poderá contribuir para a ampliação da oferta e para a diversificação da matriz energética[4]. Esta energia estaria distribuída em: energia das marés, disponível principalmente na região Norte (Amapá, Pará) e no estado do Maranhão (somando potencial de 27 GW); e em energia das ondas, principalmente nas regiões Nordeste (22 GW), Sudeste (30 GW) e Sul (35 GW)[3].

Mas nem todo esse total poderá ser aproveitado, por conflito de interesse com outras atividades, como a pesca, a maricultura, o lazer na orla e a navegação (BEIRÃO et al., 2020)[4].

Energia das correntes

Além das correntes de maré, no oceano há outros tipos de correntes, geradas por distintas forçantes. As correntes podem ser classificadas como: marítimas, de densidade, de maré, de vento e litorâneas. Na plataforma continental, em geral, a principal forçante das correntes é o atrito entre o ar (vento) e a camada superficial de água. Em praticamente toda a região costeira da Amazônia Azul, as correntes geradas pelo vento são as que possuem maior energia cinética. Essa energia pode ser aproveitada para gerar eletricidade utilizando os mesmos moinhos de vento submarinos já discutidos. Pequenas estações costeiras poderiam transformar a energia cinética das correntes geradas pelo vento em energia elétrica suficiente para abastecer bairros ou cidades menores de forma integral. Novamente, pesquisas recentes do Instituto Oceanográfico da USP mostram que a costa norte do estado de São Paulo, particularmente a região de São Sebastião, é a mais adequada para esse tipo de aproveitamento de energia marinha no estado[2].

Energia dos gradientes

A água do mar tem maiores temperaturas na superfície, com os valores diminuindo em direção ao fundo. Em determinadas regiões da Amazônia Azul, essas diferenças verticais de temperatura da água podem atingir 20°C, como nas ilhas oceânicas da Zona Econômica Exclusiva (ZEE) brasileira. Também na Plataforma Continental Média dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina essas diferenças são altas podendo ser superiores a 10°C em profundidades de cerca de 50 m ou até mesmo menores. O aproveitamento desses gradientes verticais de temperatura envolve o ciclo de evaporação - condensação de uma substância, como a amônia, por exemplo, num processo similar ao Ciclo de Carnot. Nesse caso, a amônia é evaporada pela água quente superficial, movimentando turbinas que geram energia elétrica no processo. Parte da energia gerada é utilizada para bombear águas frias das maiores profundidades, sendo estas empregadas para resfriar a amônia, retornando a mesma ao estado líquido (CASTRO et al., 2017)[2].

Gradientes osmóticos são comuns no mar, sobretudo nos estuários, onde o encontro da água doce com a água salgada forma gradientes salinos quase-horizontais marcantes, que podem gerar energia através da osmose. O fluxo de água através de membranas semi permeáveis para equilibrar a pressão osmótica pode ser usado para girar turbinas. A tecnologia poderia ser estudada para aplicação em nossos maiores sistemas estuarinos, como, por exemplo, o do Rio Amazonas e o da Lagoa dos Patos (CASTRO et al., 2017)[2].

Energia dos ventos

Os fortes ventos que sopram sobre o continente são os mesmos que sopram sobre a Amazônia Azul: entretanto, nas regiões oceânicas os ventos são, em geral, mais intensos e constantes, já que a superfície do mar é muito mais plana e homogênea do que a do continente. Em muitos países, o caminho natural de desenvolvimento dos aproveitamentos eólicos foi no rumo do continente para o oceano, tanto impulsionado pelos altos custos dos terrenos ou pela busca de maiores potenciais, quanto pela necessidade de geração próximo a centros consumidores costeiros. A maior parte dessas estruturas está fixada no leito do oceano, mas já existem modelos e cada vez mais pesquisas em plataformas flutuantes. No Brasil, a força dos ventos em terra para geração de eletricidade já é uma realidade, com uma participação de 7% na matriz elétrica atual e tendência de crescimento. As plataformas flutuantes podem ser uma alternativa interessante para estados como São Paulo e Paraná, que têm uma grande demanda próximo à costa, mas com pequeno potencial em terra (CASTRO et al., 2017)[2].

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no estudo “Potencial de energia eólica offshore na margem do Brasil”, publicado em 2011, estima em 606 GW o potencial energético no mar territorial brasileiro, sendo que 57 GW estariam em uma região de até 10 km da costa, com maior chance de aproveitamento. É claro que nem todo esse potencial pode ser efetivado [4].

Como ocorre com a energia das ondas e das marés, muitas das áreas que poderiam receber parques eólicos também são requisitadas por outras atividades econômicas e para o lazer. No entanto, mesmo que apenas um quarto dos 57 GW de potência estimada próxima da costa fosse aproveitado, ou seja, 14,25 GW, já representaria uma geração elétrica significativa[4].

Entre 2001 e 2013, o consumo de energia no país cresceu 51%. Desde lá até hoje, vem aumentando mais a cada ano. Assim, é preciso criar estratégias para que a capacidade instalada supere a demanda, e não ocorra períodos de escassez de energia. Para isso, o Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE 2022[5] previu investimentos da ordem de R$ 260 bilhões em energia elétrica, com objetivo de ampliar a capacidade instalada de geração de energia elétrica de 119,5 para 183,1 GW entre 2012 e 2022. A expansão da geração de energia prevista incluía a implantação de projetos de diferentes tipologias na zona costeira, incluindo usinas eólicas e térmicas.

Assim, vê-se que o investimento em pesquisa e desenvolvimento e melhor aproveitamento dos recursos energéticos do mar, pode ser uma solução para suprir a demanda de energia do país

Pesquisas em andamento

Nos últimos anos, tem havido importantes progressos na área de energia do mar no mundo todo. No Brasil, destaca-se algumas iniciativas, como por exemplo:

  • O Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Energia Oceânica e Fluvial (Ineof)
  • O Núcleo de Energias Renováveis do Mar do Laboratório de Tecnologia Submarina da Coppe/UFRJ
  • O Laboratório de Tecnologia Oceânica da Coppe/UFRJ
  • Os projetos “Estudos de tecnologias para a conversão de energia das ondas em energia elétrica na costa do Rio Grande do Sul (EOndas-RS)” e “Estudo teórico-experimental de tecnologias para aproveitamento de energia das ondas do mar”, da Universidade Federal de Rio Grande (Furg)
  • Proposta de criação do Programa Nacional de Energias Renováveis do Mar (Pnerm)

Usinas em funcionamento e seus impactos

É importante ressaltar também que já existem diversas usinas de geração de energia instaladas no litoral do Brasil, tanto hidrelétricas, termelétricas, nucleares,  entre outras. Essa localização pode-se justificar pela proximidade com o mercado consumidor - concentrado na costa (vide: Urbanização do Brasil). Um exemplo são as usinas nucleares de Angra dos Reis, localizadas no litoral fluminense.

Entretanto, todas essas formas de geração de energia geram, em algum nível, um impacto ambiental. A energia gerada das fontes fósseis tem impactos devido à emissão de gases de efeito estufa durante a sua queima. A energia nuclear pode ter impactos relacionados ao despejo de resíduos nucleares e radioativos. Mesmo as energias limpas, do oceano, que são aproveitadas com relativamente pequeno impacto ambiental, terão impactos locais referentes aos processos de construção das estruturas e dos sistemas necessários para esse aproveitamento de energia, e por isso, permissões para implantação e funcionamento pelas agências reguladoras deverão ser rigorosas, necessitando de estudos completos de impacto ambiental.

  1. "Agência Nacional do Petróleo (ANP). (2021). Encarte de consolidação da produção 2021: Boletim da produção de petróleo e gás natural. Disponível em: https://www.gov.br/anp/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins-anp/boletins/arquivos-bmppgn/2021/12-2021-boletim.pdf>. Acesso em 31. mai. 2022.
  2. 2,0 2,1 2,2 2,3 2,4 2,5 2,6 2,7 CASTRO M. B.; BRANDINI F. P.; DOTTORI M; FORTES J. F. A Amazônia Azul: recursos e preservação. Revista USP. São Paulo. n. 113. p. 7-26. 2017
  3. 3,0 3,1 3,2 3,3 3,4 CEMBRA. O Brasil e o mar no século XXI: relatório aos tomadores de decisão do país. 2. ed. rev. Niterói, RJ: Cembra, 2019. 491 p.
  4. 4,0 4,1 4,2 4,3 4,4 4,5 BEIRÃO, A. P.; MARQUES, M.; RUSCHEL, R. (org.). O VALOR DO MAR: uma visão integrada dos recursos do oceano do brasil. 2. ed. São Paulo: Essential Idea Editora, 2020. 247 p.
  5. Plano Decenal de Expansão de Energia 2022. Ministério de Minas e Energia. Empresa de Pesquisa Energética. Brasília: MME/EPE, 2013. Disponível em: <https://www.gov.br/mme/pt-br/assuntos/secretarias/spe/publicacoes/plano-decenal-de-expansao-de-energia/pde-2029-a-2021/pde-2022/plano-decenal-de-expansao-de-energia-pde-2022.pdf/view>. Acesso em 24. mar. 2022.