Mudanças entre as edições de "Mar Profundo"

Ir para navegação Ir para pesquisar
2 639 bytes adicionados ,  11h43min de 14 de junho de 2023
sem sumário de edição
Linha 25: Linha 25:
Nestes locais, a água do mar entra em contato com o magma presente abaixo da superfície da Terra, por meio de fissuras na crosta oceânica, tornando-a superaquecida, reagindo com os elementos químicos presentes nas rochas e solos. Dessa maneira, pode ocorrer ou não, em caso de fontes difusas, a formação de chaminés ou fumarolas, classificadas pela sua cor, dependendo de suas características físico-químicas,<ref>German, C. R.; Von Damm, K. L. 2004. Hydrothermal processes. In: Holland, H. D.; Turekian, K. K.; Elderfield, H. (Eds). Treatise on geochemistry, vol. 6. The oceans and marine geochemistry. Oxford, UK. Elsevier-Pergamon, pp. 181-222.</ref> sendo: 1) fumarolas negras, formadas a partir de precipitados de sulfetos de ferro, cobre e zinco, em altas temperaturas, e 2) fumarolas brancas, comuns em sistemas hidrotermais de temperaturas mais baixas (até 250 °C), com precipitados de sílica, anidrita e barita. No entanto, ambas fumarolas podem até mesmo ocorrer concomitantemente.<ref>Hannington, M. D.; Jonasson, I. R.; Herzig, P. M.; Petersen, S. 1995. Physical and chemical processes of seafloor mineralization at Mid-Ocean Ridges. In: Humphris, S. E.; Zierenberg, R. A.; Mullineaux, L. S.; Thomson, R. E. (Eds). Seafloor hydrothermal systems: physical, chemical, biological, and geological interactions.Geophysical Monograph, 91. American Geophysical Union: Washington, DC, pp. 115-157.</ref>
Nestes locais, a água do mar entra em contato com o magma presente abaixo da superfície da Terra, por meio de fissuras na crosta oceânica, tornando-a superaquecida, reagindo com os elementos químicos presentes nas rochas e solos. Dessa maneira, pode ocorrer ou não, em caso de fontes difusas, a formação de chaminés ou fumarolas, classificadas pela sua cor, dependendo de suas características físico-químicas,<ref>German, C. R.; Von Damm, K. L. 2004. Hydrothermal processes. In: Holland, H. D.; Turekian, K. K.; Elderfield, H. (Eds). Treatise on geochemistry, vol. 6. The oceans and marine geochemistry. Oxford, UK. Elsevier-Pergamon, pp. 181-222.</ref> sendo: 1) fumarolas negras, formadas a partir de precipitados de sulfetos de ferro, cobre e zinco, em altas temperaturas, e 2) fumarolas brancas, comuns em sistemas hidrotermais de temperaturas mais baixas (até 250 °C), com precipitados de sílica, anidrita e barita. No entanto, ambas fumarolas podem até mesmo ocorrer concomitantemente.<ref>Hannington, M. D.; Jonasson, I. R.; Herzig, P. M.; Petersen, S. 1995. Physical and chemical processes of seafloor mineralization at Mid-Ocean Ridges. In: Humphris, S. E.; Zierenberg, R. A.; Mullineaux, L. S.; Thomson, R. E. (Eds). Seafloor hydrothermal systems: physical, chemical, biological, and geological interactions.Geophysical Monograph, 91. American Geophysical Union: Washington, DC, pp. 115-157.</ref>


Bactérias como Proteobacteria e Campylobacterota possuem a capacidade de utilizar esses fluidos quimicamente reduzidos como doadores de elétrons para converter dióxido de carbono (CO<sub>2</sub>) em compostos orgânicos10 (Magdalena et al., 2021), servindo como base da cadeia alimentar quimiossintética, por meio de ecto- (fora) ou endossimbiose com diversas espécies endêmicas*. Entre os organismos dessa fauna encontram-se: poliquetas tubulares da família Siboglinidae, moluscos como Bathymodiolus, Vesicomyidae, e Provannidae; além de crustáceos, como Alvinocarididae e Kiwa (Magdalena et al., 2021).
Bactérias como Proteobacteria e Campylobacterota possuem a capacidade de utilizar esses fluidos quimicamente reduzidos como doadores de elétrons para converter dióxido de carbono (CO<sub>2</sub>) em compostos orgânicos,<ref>Magdalena N. Georgieva, Crispin T.S. Little, Valeriy V. Maslennikov, Adrian G. Glover, Nuriya R. Ayupova, Richard J. Herrington. The history of life at hydrothermal vents, Earth-Science Reviews, Volume 217, 2021, 103602, ISSN 0012-8252, <nowiki>https://doi.org/10.1016/j.earscirev.2021.103602</nowiki>.</ref> servindo como base da cadeia alimentar quimiossintética, por meio de ecto ou endossimbiose com diversas espécies endêmicas*. Entre os organismos dessa fauna encontram-se: poliquetas tubulares da família Siboglinidae, moluscos como Bathymodiolus, Vesicomyidae, e Provannidae; além de crustáceos, como Alvinocarididae e Kiwa.<ref>Magdalena N. Georgieva, Crispin T.S. Little, Valeriy V. Maslennikov, Adrian G. Glover, Nuriya R. Ayupova, Richard J. Herrington. The history of life at hydrothermal vents, Earth-Science Reviews, Volume 217, 2021, 103602, ISSN 0012-8252, <nowiki>https://doi.org/10.1016/j.earscirev.2021.103602</nowiki>.</ref>


== INFILTRAÇÕES FRIAS ==
== INFILTRAÇÕES FRIAS ==
As exsudações, infiltrações ou emanações frias (em inglês cold seeps) são ecossistemas de mar profundo comumente encontradas em margens continentais ativas e passivas tectonicamente11 (Levin, 2005), e que podem inclusive estar associadas à hidrotermalismo12 (Levin et al., 2012). Com uma variedade grande de formas (precipitados de carbonatos autigênicos*, pockmarks*, montes de hidratos e vulcões lamosos13 (Boetius, Wenzhöfer, 2013) as infiltrações frias emitem fluidos com uma mistura de gases, como metano (CH4), dióxido de carbono (CO2), hidrogênio (H2) e sulfeto de hidrogênio (H2S)14 (Levin et al., 2016).
As exsudações, infiltrações ou emanações frias (''cold seeps'') são ecossistemas de mar profundo comumente encontradas em margens continentais ativas e passivas tectonicamente,<ref>Levin, L. A. 2005. Ecology of cold seep sediments: interactions of fauna with flow, chemistry and microbes.Oceanography and Marine Biology: An Annual Review, 43, 1-46. </ref> e que podem inclusive estar associadas à hidrotermalismo.<ref>Levin, L. A.; Orphan, V. J.; Rouse, G. W.; Rathburn, A. E.; Ussler III, W.; Cook, G. S.; Goffredi, S. K.; et al. 2012. A hydrothermal seep on the Costa Rica margin: middle ground in a continuum of reducing ecosystems. Proceedings of the Royal Society, v. 279, p. 2580-2588. </ref> Com uma variedade grande de formas (precipitados de carbonatos autigênicos*, pockmarks*, montes de hidratos e vulcões lamosos)<ref>Boetius, A.; Wenzhöfer, F. 2013. Seafloor oxygen consumption fueled by methane from cold seeps. Nature Geoscience, v. 6, p. 725-734. </ref> as infiltrações frias emitem fluidos com uma mistura de gases, como metano (CH<sub>4</sub>), dióxido de carbono (CO<sub>2</sub>), hidrogênio (H<sub>2</sub>) e sulfeto de hidrogênio (H<sub>2</sub>S).<ref>Levin, L. A.; Baco, A. R.; Bowden. D. A.; Colaco, A.; Cordes, E. E.; Cunha, M. R.; Demopoulos, A. W. J.; Gobin, J.; Grupe, B. M.; Le, J.; Metaxas, A.; Netbur, A. N.; Rouse, G. W.; Thurber, A. R.; Tinnicliffe, V.; Van Dover, C. L.; Venreusel, A.; Watling, L. 2016. Hydothermal vents and methane seeps: rethinking the sphere of influence. Forintiers in Marine Science, 3: 72. doi: 10.3389/fmars.2016.00072</ref>


Elas são consideradas “frias” porque, comparadas às fontes hidrotermais, as temperaturas dos fluidos são mais baixas, além dessas emanações apresentarem velocidades menores. Entretanto, a temperatura da água das infiltrações frias são geralmente as mesmas das águas circundantes presentes no fundo do mar15 (Suess, 2014).
Elas são consideradas “frias” porque, comparadas às fontes hidrotermais, as temperaturas dos fluidos são mais baixas, além dessas emanações apresentarem velocidades menores. Entretanto, a temperatura da água das infiltrações frias são geralmente as mesmas das águas circundantes presentes no fundo do mar.<ref>Suess, E. Marine cold seeps and their manifestations: geological control, biogeochemical criteria and environmental conditions. Int J Earth Sci (Geol Rundsch) 103, 1889–1916 (2014). <nowiki>https://doi.org/10.1007/s00531-014-1010-0</nowiki></ref>


Semelhante às fontes hidrotermais, a fauna desses ecossistemas depende de microorganismos quimiossintéticos, que representam a principal fonte de alimento para organismos maiores. Outra característica interessante é que a intensidade e composição do fluxo desses fluidos vai determinar o tipo de comunidade dominante, sejam de tapetes microbianos (bactérias Beggiatoa sp., em infiltrações mais ativas e ricas em metano) ou moluscos (relacionados a ambientes menos ativos)16 (Martin et al, 2007; Suess, 2014).
Semelhante às fontes hidrotermais, a fauna desses ecossistemas depende de microorganismos quimiossintéticos, que representam a principal fonte de alimento para organismos maiores. Outra característica interessante é que a intensidade e composição do fluxo desses fluidos vai determinar o tipo de comunidade dominante, sejam de tapetes microbianos (bactérias Beggiatoa sp., em infiltrações mais ativas e ricas em metano) ou moluscos (relacionados a ambientes menos ativos).<ref>Martin, R. A.; Nesbitt, E. A.; Campbell, K. A. 2007. Carbon stable isotopic composition of benthic foraminifera fromPliocene cold methane seeps, Cascadia accretionary margin. Palaeogeograpgy, Palaeoclimatology, Palaeoecology, v. 246, p. 260-277. </ref>


== GRANDES QUEDAS ORGÂNICAS ==
== GRANDES QUEDAS ORGÂNICAS ==
Considerando-se o estado oligotrófico geral do mar profundo, quando grandes quantidades de alimento chegam nesse ambiente, a composição da fauna local sofre uma alteração considerável. Entre as possíveis quedas orgânicas, temos: macroalgas (como kelps), madeiras e diferentes carcaças de vertebrados17 (Tunnicliffe et al., 2003; Bernardino et al., 2012), sendo as de baleias as mais estudadas até o momento18 (Smith; Baco, 2003).
Considerando-se o estado oligotrófico geral do mar profundo, quando grandes quantidades de alimento chegam nesse ambiente, a composição da fauna local sofre uma alteração considerável. Entre as possíveis quedas orgânicas, temos: macroalgas (como kelps), madeiras e diferentes carcaças de vertebrados,<ref>Tunnicliffe, V.; Juniper, S. K.; Sibuet, M. 2003. Reducing environments of the dee-sea floor. In: Tyler, P. A. (ed). Ecosystems of the World, v. 28. Ecosystems of the deep Oceans, pp. 81-110.</ref><ref>Bernardino, A. F.; Levin, L. A.; Thurber, A. R.; Smith, C. R. 2012. Comparative composition, diversity and trophic ecology of sediment macrofauna at vents, seeps and organic falls. PLoS ONE, v. 7: e33515.</ref> sendo as de baleias as mais estudadas até o momento.<ref>Smith C. R,; Baco, A. R. 2003. Ecology of whale falls at the deep-sea floor. Oceanography and Marine Biology: an Annual Review, 41, 311-354.</ref>


Recém-descoberto, esse ecossistema de mar profundo tem origem logo após o afundamento de uma carcaça de baleia, quando diversos animais oportunistas saprófagos* ou detritívoros* surgem para consumirem sua carcaça, atraindo até mesmo outras espécies não usuais naquela área19 (Yin et al., 2023).
Recém-descoberto, esse ecossistema de mar profundo tem origem logo após o afundamento de uma carcaça de baleia, quando diversos animais oportunistas saprófagos* ou detritívoros* surgem para consumirem sua carcaça, atraindo até mesmo outras espécies não usuais naquela área.<ref>Yin K, Zhang D, Xie W. Experimental Whale Falls in the South China Sea. Ocean-Land-Atmos. Res. 2023; 2: 0005. <nowiki>https://doi</nowiki>. org/10.34133/olar.0005.</ref>


O consumo dessa grande fonte de matéria orgânica ocorre de acordo com quatro estágios principais: 1) Na primeira fase, animais saprófagos (carniceiros) retiram e consomem todo o tecido mole (mais externo) das baleias; 2) Em seguida, espécies oportunistas (particularmente poliquetas e crustáceos) colonizam densamente a carcaça, removendo toda a carne e deixando apenas o esqueleto; 3) A terceira fase é caracterizada pela presença de organismos quimioautotróficos (bactérias tiofílicas, metanogênicas e Archaea) que consomem e colonizam a carcaça; 4) Por fim, o estágio recifal, no qual filtradores colonizam o restante do esqueleto. A duração de cada estágio depende do tamanho da carcaça, da profundidade do local onde ela caiu e outras variáveis ambientais (Smith; Baco, 2003).
O consumo dessa grande fonte de matéria orgânica ocorre de acordo com quatro estágios principais: 1) Na primeira fase, animais saprófagos (carniceiros) retiram e consomem todo o tecido mole (mais externo) das baleias; 2) Em seguida, espécies oportunistas (particularmente poliquetas e crustáceos) colonizam densamente a carcaça, removendo toda a carne e deixando apenas o esqueleto; 3) A terceira fase é caracterizada pela presença de organismos quimioautotróficos (bactérias tiofílicas, metanogênicas e Archaea) que consomem e colonizam a carcaça; 4) Por fim, o estágio recifal, no qual filtradores colonizam o restante do esqueleto. A duração de cada estágio depende do tamanho da carcaça, da profundidade do local onde ela caiu e outras variáveis ambientais (Smith; Baco, 2003).
161

edições

Menu de navegação